Como formar profissionais sob a ótica do ESG?

30/06/2023
Os profissionais brasileiros estão preparados para desenvolver a mineração sob a ótica do ESG? Este foi o tema do último painel do dia 28/06.

 

Os profissionais brasileiros estão preparados para desenvolver a mineração sob a ótica do ESG? Este foi o tema do painel “ESG e Transição Energética na Formação de Profissionais de Mineração”, moderado por Roberto Xavier, diretor-executivo ADIMB e que contou com a participação de Maria José Salum, do Conselho de Sustentabilidade da Sigma Mineração e conselheira da Brasil Mineral, Caiubi Emanuel Souza Kuhn, presidente da Federação Brasileira de Geólogos – FEBRAGEO, Giorgio de Tomi, representante da ABREMI e Gilberto Calaes, assessor do SGB/CPRM. 

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Roberto Xavier comentou os impasses do setor mineral para uma transição energética e que há necessidade de avanços tecnológicos para as matrizes limpas. Ele disse ser preciso a extração de minerais/metais estratégicos que geram um impacto considerável na cadeia de produção do setor. “A sociedade quer o seu bem-estar e tem percepção negativa da mineração, devido a problemas socioambientais”. Por um outro lado, há o ESG, que está no topo da agenda climática ao lado das mudanças climáticas, com as empresas adotando as práticas com mais constância para atender ao mercado. 

Para Xavier, a transição energética trouxe um novo ciclo de muitas commodities e hoje algumas delas passaram a figurar como “queridinhas”, como o lítio, e isso demanda uma procura por profissionais mais bem preparados para trabalhar no setor. O problema é que os cursos em ciências geológicas e da Terra vêm caindo ao longo dos anos (Geologia/engenharia geológica), pelo fato das pessoas não serem atraídas pelo setor mineral por conta da má reputação do setor, além de poucos grupos de pesquisa e a queda de profissionais experientes em pesquisa mineral e mineração. A relação candidato vaga tem sido 2,6. 

Segundo ele, os CEO’s de empresas mineradoras dizem haver falta de talentos no setor, e, no Canadá, um exemplo disso, é que em um grupo de jovens entre 15 e 30 anos, 70% deles consideraram provavelmente ou definitivamente não atuar na mineração. Há uma crise de mão-de-obra no setor mineral, enquanto outros CEOs dizem ser um grande desafio para o setor recrutar novos talentos e com habilidades. 

Maria José Salum, conselheira de Sustentabilidade da Sigma Mineração e conselheira da Brasil Mineral, abordou o ESG de forma mais global e disse que a maior parte das imagens (quase 70%) se relacionavam com meio ambiente. “O ESG não é só isso. Estudo alguns projetos com essa visão de sustentabilidade ESG, e é interessante quando se participa do nascimento de um projeto, que nasce com a concepção ESG. A sigla não é uma sopa de letras, mas é onde você começa a colocar várias sementes, é um acúmulo de questões pontuadas e soluções para saná-las”. 

Para chegar até o ESG, Maria José Salum lembrou a ECO-92, uma jornada de sustentabilidade, onde foi instituída a Agenda 21 e passou-se por diversos eventos até chegar ao Acordo de Paris (2015). O Brasil aderiu a todos os movimentos e não conseguiu cumprir nem 60% dos objetivos ODS. “O que acabaçou faltando? Faltaram ações da ONU para o mercado financeiro. A primeira questão foi o Princípio do Equador, em 2003, que estabelece garantias para instituições financeiras a identificar, avaliar e gerenciar os riscos socioambientais, separados por categorias A (alto risco/sem financiamento), B (médio risco) e C (baixo risco). “São princípios gerais, mas com metas estabelecidas em que a empresa tem que demonstrar o que faz”. 

O ESG apoia-se nos próprios Princípios do Equador, mas ligado a outros grupos financeiros e que buscam princípios sociais, ambientais e de Governança. Muitas empresas atualmente usam os ODS como parâmetro para medir os desempenhos ESG. “O ESG não é uma onda, é um negócio”, segundo o presidente da B3, apontou ela, acrescentando que “em 2018 reunimos 14 empresas de mineração – sete de grande porte, seis de médio porte e uma de pequena escala – e conseguimos varrer os 17 princípios do ODS em todas as regiões do País e em todas as classes de bens minerais. Agora, com a transição energética, surgiu a descarbonização e o questionamento é se ser net zero é ser ESG. Não é! O ESG não é o cumprimento de uma listagem de ações socioambientais e de descarbonização, e em uma empresa todos os aspectos devem estar demonstrados”. Maria José cita a importância da Governança sobre o E sobre o S é a peça chave para a escolha do projeto mais sustentável. 

Para a conselheira, na área de RH, o geólogo sempre será importante, mas o mundo precisa de um olhar mais holístico, principalmente pelos fatores modificadores (ver a vegetação do entorno, recursos hídricos, quilombolas, indígenas) para dimensionar o que o projeto vai medir para ser executado. O engenheiro de minas é o mesmo, mas tem que pensar no planejamento da lavra, desmonte de rochas controladas, frotas e emissões de CO2, disposição de rejeitos e estéril. 

Uma ação convencional socioambiental é garantir os hectares recuperados ambientalmente e o número de árvores plantadas. “Todas as empresas terão isso em seus inventários”. Já a ação ESG prevê as mesmas ações, adicionadas por hectares que não foram suprimidos por decisão da própria empresa de realocação de seu projeto de mineração. “Por exemplo, não vou colocar pilhas de rejeitos onde tenha que suprimir vegetação”. 

A formação do profissional para o ESG atualmente deve integrar questões ambientais e sociais aos conteúdos técnicos e projetos integrados de conhecimento, contemplando questões socioambientais. “Nem sempre os funcionários da empresa conhecem as ações de ESG praticadas pela sua empresa. Ou seja, os próprios empregados não sabem o que a companhia realiza. Nossos colaboradores são a melhor comunicação com a sociedade, por morar na comunidade. Eles têm que saber o que as empresas fazem para que possamos mudar a visão negativa da nossa atividade”.  

Gilberto Calaes, do SGB, iniciou a apresentação tratando a transição energética como uma nova revolução industrial, com novas fontes de energia e exponencial expansão das energias renováveis e biomassa, com a energia elétrica a depender menos de energia fóssil e cada vez mais de uma matriz limpa. “É importante passar para as próximas gerações que, para entender o ESG, é necessária uma compreensão de todos os antecedentes, como Kyoto, COP-21, etc. Assim como o ESG, outros paradigmas estão em jogo e influenciam os profissionais do setor”. 

Sobre o desafio de equilibrar o processo de suprimentos, Calaes comentou que o custo com geração de energia renovável vem caindo nos últimos 15 anos e a geração de energias eólicas, solar, de hidrogênio, deverão dominar esse mercado, com redução de emissão de GEE e descarbonização da economia. “A transição energética tende a favorecer países desenvolvidos, com o avanço de tecnologias rumo à descarbonização, com potencialidades em minerais de transição energética”. 

Estados Unidos, China e União Europeia estão mais adiantados em fontes limpas, e em especial a China, que lidera a produção de grafita, e precisam desenvolver as fontes para suprir a demanda. “O Brasil deve assumir políticas mais agressivas devido à sua capacidade de energia limpa, já que a Austrália atraiu mais de US$ 9 bilhões nos últimos 12 anos e o Canadá transformou-se em um polo de referência no suprimento de minerais de transição energética”. Para uma base de transição energética mais justa e desconcentrada, Calaes diz que é preciso estimular programas de cooperação bilateral e multilateral e de integração transacional de cadeia de suprimento, promovendo relacionamentos pragmáticos e proativos para incentivar o intercâmbio, assegurar a assertiva absorção de ICA e impulsionar fluxos de investimentos, transferência de tecnologias e acesso a mercados. “A emergência da transição energética para uma economia circular, verde e digital abrem oportunidades de relacionamentos entre países detentores de potencial de minerais de transição energética e as nações que não dispõem deles, diminuindo desigualdades existentes entre países desenvolvidos, não desenvolvidos e em desenvolvimento, ao distribuir de forma mais igualitária benefícios socioeconômicos e socioambientais”. 

Representando a ABREMI, Giorgio de Tomi fez uma apresentação sobre o ESG dentro do contexto da mineração de pequena escala e afirma que a mineração tem que transformar o setor. “Isto só acontecerá se for criado um pacto para atender às exigências da sociedade”. Segundo De Tomi, o principal problema do pequeno minerador é a falta de acesso a crédito, o que dificulta a realização de pesquisas minerais e outros nem a realizam, ou fazem de modo insuficiente, e em condições inadequadas, não atendendo critérios ESG. 

“Para priorizar o ESG temos que usar o extensionaismo mineral, empreendedorismo (atrair jovens por startups) para que contribuam com os garimpos de ouro e minerais críticos, por exemplo”. O E tem muito que evoluir, já o S na pequena mineração tem uma pegada mais forte, mas a Governança tem que ser muito trabalhada. “Não existe solução única para essa transformação encorajando associativismo e cooperativas. É preciso trabalhar a evolução da Governança e fortalecer as instituições do setor (ANM e CETEM). Sem instituições fortes, não dá para fazer quase nada. Outro ponto é a autorregulação e aproximação de grandes mineradoras com pequena e média mineração e modelos de negócios equilibrados”.

Caiubi Kuhn, presidente da Federação Brasileira de Geólogos (FEBRAGEO) abordou ‘ESG, educação e mediação de conflitos’, afirmando que as mineradoras gastam muito para mediação de conflitos, com processos e não investem quase em programas educacionais voltados à comunidade. “A imagem da mineração é péssima para a comunidade, seja pelos acidentes das barragens ou garimpos ilegais, mas isto pode mudar, desde que seja apresentado que a mineração está presente na vida das pessoas, desde a moradia, carro, celular, computador. As pessoas não entendem isso, mas usam a mineração diariamente”. 

A sociedade não sabe o motivo pelo qual a mineração está no lugar próximo de onde ela mora e a razão é que as pessoas não conhecem os motivos dos projetos. “Este é o maior fator de conflitos e a mineradora tem que convencer a comunidade de que ela precisa de mineração e que usam a mineração 24 horas”, diz  Caiubi. E a educação é a melhor medida para mediação de conflitos entre essas partes, por meio de estratégias educacionais em escolas e nas comunidades, história geológica, dos recursos minerais e explicar  razão pela qual a mineração está ali. “Nos cursos de Geologia e Engenharia de Minas, a formação sobre ESG estará nos cursos de extensão. Desde 2018, criou-se a Resolução nº 7, do Conselho Nacional de Educação (CNE), em que as atividades de extensão deverão compor pelo menos 10% da carga horária dos cursos de graduação, o que corresponde a 360 horas de extensão (diálogos com a comunidade)”. Para Caiubi, a mineração tem que aprender a fazer mídia positiva, mostrando o que a mineração faz de bom, além de mostrar que a atividade está ligada com vários ODS, um deles, o 12, de consumo e produção responsável. “Dentro disso, está à criação de uma nova imagem para o setor. A mineração será uma necessidade crescente para se manter uma qualidade de vida nos países”, concluiu.