Pensar o futuro é desafiador. Parafraseando o economista John Kenneth Galbraith, não podemos compreender corretamente o presente sem conhecer o passado que nos trouxe até aqui, e certamente aquilo que o futuro nos reserva está condicionado pelo caminho que estamos pavimentando hoje. Então falar do futuro é também falar do passado e seu desdobramento no agora.
Um olhar retrospectivo da mineração mostra as diferentes trajetórias que a atividade já percorreu e não à toa a história da humanidade é datada pelas fases dos minerais de maior destaque em seu tempo e não é de menos afirmar que a civilização é moldada por minerais. No “mundo vazio”, para usar uma metáfora de Herman Daly ao se referir ao tempo em que o mundo era pouco povoado, com escasso consumo e em que a natureza era um bem livre, era aceitável pagar um elevado preço em termos de danos ambientais para a transformação do padrão de vida e promoção do crescimento econômico, e a mineração poder crescer e também gerar externalidades sem muitas travas.
No entanto, desde aproximadamente o pós-Segunda Guerra Mundial, a humanidade passou a ingressar profundamente na denominada “era do antropoceno”, que se caracteriza pela grande aceleração no crescimento populacional, no consumo de recursos naturais, nas emissões de gases nocivos e demais poluentes ambientais, entre outros.
Isso significa que estamos em um “mundo cheio” que cresce anualmente, em termos populacionais, o equivalente a uma Inglaterra (75 milhões de pessoas), que se soma aos 8 bilhões de habitantes que compartilham o mesmo planeta finito, no qual não há mais espaços livres, pois praticamente todos os territórios têm algum uso ou ocupação. Todavia, os fundamentos econômicos que foram criados quando o mundo era vazio são os que ainda prevalecem, com a ideia arraigada de que a natureza não representa obstáculos para o crescimento econômico e que fator escasso é o capital, tido como principal limitante. Então assistimos aprofundar o desequilíbrio entre a lógica de funcionamento do sistema econômico, que exige estímulo do capital para continuar se expandindo, e as novas necessidades desse mundo cheio que já se ressente da escassez da base de recursos naturais e, principalmente, de serviços ecossistêmicos. No "mundo cheio", portanto, o fator limitante do crescimento econômico passa a ser a natureza, isto é, os recursos naturais e os serviços ecossistêmicos, inclusive o clima.
O avanço científico tem demonstrado que as áreas especialmente protegidas, que constituem o “capital natural crítico”, são de importância crucial não apenas porque se constituem na base da vida, mas porque realizam uma infinidade de serviços de provisão (água, alimentos, ar etc.), de regulação (do clima, dos solos, do ar, prevenção de erosão, polinização, ciclo de nutrientes etc), culturais e estéticos, entre outros, e sem esses serviços a vida na terra seria improvável, especialmente para o ser humano.
A emergência climática que o mundo cheio atravessa nesta era do antropoceno ameaça toda a humanidade, não o planeta, pois a Terra é resiliente e vai se adaptar, como tem feito há 4,6 bilhões de anos. Se houver uma mudança climática drástica, é o ser humano que vai desaparecer, assim como já desapareceram milhares de outras espécies. Como a ilustração mostra, a humanidade surge por último na trajetória da existência da vida na Terra, e se essa história fosse compactada em um dia de 24 horas, o ser humano apareceria nos últimos segundos próximos da meia noite. Eles são um dos últimos seres a surgir, porque são dependentes de toda a base da vida pré-existente. Todavia, a lógica econômica de mundo vazio, em um mundo cheio, está acelerando muito rapidamente o avanço do consumo dos recursos naturais e prejudicando a realização dos serviços ecossistêmicos que dependem da base desses recursos para acontecer.
Nesse contexto de mundo cheio, a mineração tem que competir cada vez mais com as áreas previamente utilizadas, quer seja para fins de recreação, quer para usos econômicos, para fins de preservação, como suporte à geração de renda de populações, mesmo aquelas áreas que se estima estarem vazias, entre outros. Um exemplo bem emblemático disso na Amazônia ocorreu com o projeto da Alcoa, em Juruti, no Pará, no início dos anos 2000, em que a empresa que fez os estudos de impacto ambiental presumiu que a área que seria diretamente afetada (ADA) pela mineração não tinha utilização humana. Porém, a área era usada para a coleta da castanha. Mas ao realizar os levantamentos na entressafra, a empresa presumiu que não havia habitantes ali, muito embora o território fosse totalmente usado pela população extrativista local, que retirava boa parte de sua renda dos castanhais nativos do platô. Isso resultou em muita polêmica, diversas audiências públicas e também no pagamento de royalties aos extrativistas, considerados como superficiários da área.
Veja a matéria completa na edição 435 de Brasil Mineral