Contestados 60 requerimentos em Terras Indígenas
Um grupo de organizações indígenas contesta, na Justiça, 60 processos ativos na Agência Nacional de Mineração (ANM) que têm como meta a exploração de ouro em terras do médio e alto rio Negro. Segundo as organizações, caso os projetos avancem, podem impactar mais de 45 mil indígenas, de acordo com documento da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn), protocolado em julho na Justiça Federal no Amazonas. A petição tem como base um levantamento do Instituto Socioambiental (ISA).
A região do alto e médio rio Negro é conhecida como Cabeça do Cachorro e engloba indígenas de 23 etnias, que convivem em 750 comunidades de nove terras indígenas, nas imediações de São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos. Os 60 requerimentos ativos na ANM buscam autorizações para pesquisa e exploração de ouro em áreas que somam 149 mil hectares, quase o tamanho da cidade de São Paulo. A manutenção destes processos ativos contraria decisões da Justiça Federal no Amazonas, que já determinou a invalidação dos mesmos diante da ilegalidade da exploração de ouro e outros minérios em áreas de terras indígenas.
Dos 60 pedidos da ANM, 25 foram protocolados no governo Jair Bolsonaro, à espera de regulamentação. Caso sejam levados em consideração outros processos de exploração mineral, referentes a estanho, cassiterita, nióbio, cascalho e areia, o número de requerimentos ativos chega a 77.
O ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general Augusto Heleno, autorizou o avanço de sete projetos de exploração de ouro na região da Cabeça do Cachorro, que somam 12,7 mil hectares e estão em trechos e ilhas do rio Negro que cortam duas terras indígenas, onde vivem povos de 11 etnias. O ministro do GSI é secretário-executivo do Conselho de Defesa Nacional, a quem cabe autorizar projetos de mineração na faixa de fronteira – até 150 km adentro. Depois da revelação, partidos e congressistas apresentaram pedidos ao STF (Supremo Tribunal Federal), PGR (Procuradoria-Geral da República), MPF (Ministério Público Federal) e Congresso para derrubar os atos de Heleno. O MPF passou a investigar as autorizações. Duas ações passaram a tramitar no STF. O ministro Heleno decidiu cancelar as medidas, diante da constatação por órgãos do governo de que os chamados assentimentos prévios liberaram projetos em áreas de terras indígenas.
As organizações levaram em conta os requerimentos ativos nas áreas das terras indígenas Jurubaxi-Téa, Rio Téa, Yanomami, Médio Rio Negro I, Médio Rio Negro II e Cué-Cué Marabitanas – um dos assentimentos prévios assinados por Heleno incidia sobre esta última. A região é um “mosaico de áreas ambientalmente protegidas”, segundo a petição da Foirn. Além das terras indígenas, a área inclui o Parque Nacional Pico da Neblina – também afetada pela autorização do ministro do GS I- e a Floresta Nacional do Amazonas. “É a maior região úmida do mundo”, cita o documento protocolado na Justiça. “O rio, além de ser fonte de recursos naturais para estes povos, compreende a dimensão da territorialidade ancestral dos indígenas que milenarmente ocupam a bacia do rio Negro”, afirma a Foirn na petição. “É, ainda, um local sagrado, que integra a cosmovisão indígena, sendo palco de diversos mitos de origens dos diferentes povos que habitam a região”.
O presidente da Foim, Marivelton Barroso, afirma que qualquer exploração minerária no rio Negro impacta as terras indígenas e os povos que moram nesses territórios. “Os mais afetados seremos nós. Não são o governo, as empresas, a sociedade urbana, mas a gente que está dentro do território. Não temos proteção do Estado, e o assédio acaba chegando às comunidades”, diz.