Bolsonaro quer viabilizar exploração em TIs

04/03/2022
O texto controverso ainda não avançou e levanta dúvidas de especialistas sobre a viabilidade econômica.

 

Com o conflito Rússia x Ucrânia, o presidente Jair Bolsonaro enviou Projeto de lei ao Congresso que defende a exploração mineral em terras indígenas. “Em 2016, como deputado, discursei sobre nossa dependência do potássio da Rússia. Citei três problemas: ambiental, indígena e a quem pertencia o direito exploratório na foz do rio Madeira (existem jazidas também em outras regiões do país)”, escreveu em suas redes sociais. 

Com o projeto, o presidente pretende que o Brasil se torne autossuficiente na produção de fertilizantes, hoje importados em grande parte da Rússia e de Belarus. Segundo Bolsonaro, a aprovação do projeto de lei permite a exploração de recursos minerais, hídricos e orgânicos em terras indígenas e terminaria com o problema. O potássio é elemento essencial para produção de fertilizantes utilizados pelos produtores brasileiros. “Com a guerra Rússia/Ucrânia, hoje corremos o risco da falta do potássio ou aumento do seu preço. Nossa segurança alimentar e agronegócio exigem de nós, Executivo e Legislativo, medidas que nos permitam a não dependência externa de algo que temos em abundância”, complementou. 

A Constituição Federal condiciona a mineração no território indígena à prévia autorização do Congresso Nacional e à concordância da população indígena que vive no território. O projeto encaminhado há dois anos por Bolsonaro ao legislativo regulamenta o tema e retira o poder de veto dos povos originários em determinados tipos de atividade econômica. O texto controverso ainda não avançou e levanta dúvidas de especialistas sobre a viabilidade econômica. 

Outro lado

Em nota, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) afirma que o Governo Bolsonaro, em janeiro de 2020, já havia enviado o Projeto de Lei (PL) 191/2020, que pretende regularizar a mineração e a exploração de hidrocarbonetos em terras indígenas, desconsiderando o direito dos povos originários à autodeterminação e à consulta prévia, livre e informada. Em 2021 e em 2022, este Projeto de Lei foi indicado pelo governo como um dos projetos legislativos prioritários para apreciação no Congresso Nacional. 

Segundo dados da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e da entidade Amazon Watch, no relatório Cumplicidade na Destruição IV, mais de 500 empresas mantêm ativos 2,5 mil pedidos de mineração na Agência Nacional de Mineração (ANM), afetando 261 terras indígenas. Além das declarações públicas em redes sociais do presidente, a base governista no Congresso Nacional já está pedindo adesão entre os deputados federais a um Requerimento de Urgência assinado pelo líder do governo na Câmara, Ricardo Barros, solicitando a apreciação rápida e em plenário do PL 191, sem passar pelo devido procedimento de análise nas Comissões. 

Segundo a nota, essa estratégia visa acelerar a aprovação de iniciativas legislativas diretamente em plenário e já foi utilizada pelos aliados do governo no Congresso em 2021 e mostra claramente a intenção de aprovar nesta legislatura, de qualquer forma, os projetos que atendem aos interesses dos setores de apoio ao governo Bolsonaro. Um dos principais focos de pressão neste momento está no interesse do governo de liberar a exploração de potássio nos territórios do povo indígena Mura, na região do Baixo Rio Madeira, próximo da foz com o Amazonas. Isso resolveria, segundo Bolsonaro, a previsível queda na importação de potássio da Rússia por causa do atual conflito na Europa, argumento que vem sendo refutado estes dias por especialistas na área. 

Em 2019, o governo Bolsonaro se reuniu em várias ocasiões com representantes do banco canadense Forbes & Manhattan, que está por trás das empresas Belo Sun - interessada na exploração de ouro, na Volta Grande do Xingu - e a Potássio do Brasil - com interesse na exploração de potássio nas terras do povo Mura.  Já durante os anos de 2020 e 2021, em plena pandemia, houve pelo menos sete reuniões entre o Executivo e representantes diretos da Potássio do Brasil e o empreendimento foi contemplado dentro da chamada política Pró-Minerais Estratégicos na qual o governo se compromete a facilitar o licenciamento ambiental.

Na região do Baixo Rio Madeira, pelo menos 29 terras indígenas Mura apresentam alguma pendência no procedimento administrativo de demarcação; dentre elas, 17 terras indígenas estão sem nenhuma providência por parte da Funai e algumas das terras já homologadas estão sendo contestadas na Justiça por particulares. 

Ainda segundo a nota, a liberação da mineração dentro de terras indígenas teria como resultado impactos gravíssimos para a saúde das comunidades e para seu entorno, inviabilizando seus projetos de vida. Afeta diretamente o usufruto exclusivo das comunidades sobre seus territórios e compromete a determinação livre destes povos de escolher seus próprios caminhos.