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O desafio de ser pequeno e sustentável

23/06/2021
“Não existe desenvolvimento sustentável, sem mineração responsável”

 

“Não existe desenvolvimento sustentável, sem mineração responsável”. Foi com esta citação, emprestada de pesquisadores da Universidade de Delaware (EUA), que o engenheiro de minas e professor Giorgio De Tomi abriu o painel 2 do seminário Metso Outotec/Brasil Mineral sobre a mineração na região Norte do País, no dia 18 de junho, e que teve como tema "O papel da pequena e média mineração no desenvolvimento da região Norte". Além do professor De Tomi, do NAP-USP, o evento contou com a participação, como debatedores, do presidente da Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa Mineral (ABPM), o geólogo Luis Mauricio Azevedo, e do Diretor de Geologia da SEDEME-PA, Ronaldo Lima. 

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O professor De Tomi acrescentou que 37 minerais críticos previstos para o Século XXI são produzidos por pequenas e médias mineradoras e que, portanto, não existe desenvolvimento sustentável sem a pequena e média mineração responsável na região Norte no Século XXI. 

Citando dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), ele informou que, em um período de dez anos, de mais de 227 mil requerimentos de pesquisa, apenas 2.993 conseguiram concessão de lavra, o que corresponde a 1,3% do total. “Mesmo com todo esse investimento em pesquisa mineral é difícil obter sucesso. Imagine uma Micro, pequena e média mineração (MPM)”? Este grupo responde por 98% dos títulos minerários do Brasil e o futuro da mineração neste século está com as MPMs. 

O professor apresentou uma série de agendas sobre desenvolvimento sustentável nos últimos anos. “Uma Pesquisa da E&Y sobre ESG diz que as MPMs precisam entender a Agenda 2030 para não serem deixadas para trás. Em 2016, pelo fato da mineração ser complexa, a ONU lançou o Guia dos ODS para o setor e três anos depois o Banco Mundial publicou os objetivos de desenvolvimento sustentáveis mais relevantes para as MPMs, como igualdade de gênero e o papel da MPM mineração na integração regional. Mas, de 2019 para cá, apareceram mais demandas para os mineradores, então o International Council on Mining and Metals (ICMM) associou os ODS a 10 princípios que podem contribuir para decisões estratégicas do setor”. 

Em 2020 foi publicada a Resolução da ONU sobre Governança Mineral, em que De Tomi citou alguns destaques, como investimento em apoio, suporte, capacitação das pessoas; integração dos planos de fechamento de minas  e a interação de mineradoras com as comunidades. Por último, o professor comentou o Novo padrão Global de Gerenciamento de Rejeitos na Mineração  - um padrão global, com versão em português, e que cria o envolvimento de comunidades afetadas por qualquer tipo de decisão, compartilhando o conhecimento, trabalhando em construção, operação e monitoramento, acesso público ao resultados dos projetos e toda a parte de ESG. 

Para ele, a MPM da região Norte não conseguirá ir em frente, seguir esses preceitos de forma isolada. “Há uma necessidade de parcerias”. Outro ponto é o uso de tecnologias limpas na cadeia inteira e não apenas na usina. Desenvolvimento social está associado aos pilares sócio, econômico e ambiental e necessita de parcerias, associações cooperativas, e o acesso a capital.  

“A MPM da região Norte precisa evoluir, pensar dessa forma, se planejar, se adequar, melhorar a vida das pessoas, em um trabalho conjunto para o desenvolvimento sustentável e entendendo a população local. Quando a gente fala em mineração responsável, falamos em “Planeje a mina, Cumpra o plano””, concluiu De Tomi. 

Luís Maurício Azevedo, da ABPM, considera a mineração no Norte desafiadora. O primeiro gargalo a se enfrentar é a área. Atualmente, o quadro é muito mais complexo. “Hoje, a ANM tem 180 mil títulos, dos quais 50 mil requerimentos indefinidos e sem a perspectiva de se tornar um alvará”. Ele disse que existem 50 mil ofertas públicas em parcerias com PPI (Programa de Parcerias em Investimentos) – um grande passo do Governo - mas que o mais difícil é existir cerca de 30 mil alvarás de pesquisa, que sofrem há mais de um ano em razão da paralisação da ANM por causa da pandemia. “É um prejuízo muito difícil de retirar nos próximos anos”. 

O geólogo diz ainda que o mais complicado é achar uma área para se minerar. E, depois de encontrar tal espaço, a próxima etapa é a obtenção do licenciamento ambiental, que no Brasil demora no mínimo dez anos. “Após os acidentes em Brumadinho e Mariana, ficou mais difícil obter licenças - são várias. No Brasil, a pequena mineração não obtém aval antes de oito anos”. Além dessa morosidade, outro problema enfrentado pelo setor é a antipatia da sociedade com o setor. 

Luís Maurício informa que está no terceiro projeto. O primeiro foi o Rio Verde (fertilizantes), no Norte, o segundo a Avanco (cobre) e hoje outro projeto de fertilizantes. “Temos uma mina única no mundo com prestabilidade para indústria mineral e agronegócio, pois não temos rejeito e não usamos recursos hídricos. Nós moemos a rocha e vendemos para o agricultor”. O geólogo resolveu instalar um parque solar para zerar as emissões de CO2 a zero. “Mas estou com dificuldade de obter autorização para mudar a matriz há dois meses. Isso é um desestímulo”. Outro ponto é a imagem da ilegalidade da mineração. “O investidor não sabe quem está na floresta e quem está fora – o investidor pergunta: O Brasil protege ou agride a floresta?. A cada ano produzimos menos massa mineral. O Brasil produz três commodities (minério de ferro, manganês e nióbio)”. 

Ronaldo Lima, da SEDEME-PA, disse que o Pará é o maior estado produtor mineral do Brasil, com arrecadação de R$ 3.1 bilhões de CFEM, mais taxa mineral com mais de R$ 550 milhões. A mineração é um dos pilares da economia paraense. “Grande parte dessa arrecadação é da grande mineração – minério de ferro da Vale – e teremos produção e arrecadação recorde em 2021. O Pará faz o cadastro mineral de 540 empresas de mineração, das quais 90% são MPM. A pequena mineração tem importância muito grande, mas são ilegais (em áreas indígenas) ou irregulares (problemas com licenciamento) e temos que trazer para a regularização”. O Pará quer regularizar e fiscalizar essa atividade ilegal e irregular, pois todo o passivo ambiental acaba caindo sobre o Estado. 

Em relação à sustentabilidade, Lima cita a visão mais moderna do gerenciamento ambiental sob o aspecto das mudanças climáticas, seus impactos e feitos nas comunidades. “O fato é que hoje nenhuma atividade que explore recurso natural será concebida sem que atenda aos conceitos de sustentabilidade, pois ficará à margem, principalmente na Amazônia”. 

Sobre o critério utilizado para classificar a pequena, micro e média empresa de mineração aplicada pela ANM, os participantes responderam se era o mais adequado. A agência utiliza o critério de movimentação por tonelagem bruta. Os convidados também abordaram o que se poderia fazer para a tecnologia se adequar ao depósito (não o contrário). E como fazer isso de forma sustentável? 

O professor De Tomi disse que o critério utilizado no Brasil é igual ao de outros países. Mas, citou como exemplo o Equador que sugeriu uma escala contínua que acompanha a tributação com a escala do negócio. Sobre tecnologia, De Tomi comentou que poderia ser adotado o programa “Extensionismo Mineral, do antigo DNPM, que apoiava e dava suporte técnico de acordo com cada região, de cada vocação mineral de cada local. A ANM e CPRM e as organizações regionais poderiam retomar o programa”. 

Luís Maurício disse que o Brasil tem as “super minas” (Carajás, Salobo, S11D, Serra Leste, depósitos de caulim e bauxita, que são consideradas grandes) e, com isto, a classificação das minas médias acaba sendo afetada, pois elas passam a ser tratadas como pequenas, enquanto as verdadeiramente pequenas viram quase uma pedreira, depósito de argila. As “super minas” devem ser isoladas e ter um critério especial. E o melhor critério é o faturamento””. O geólogo disse ainda que no Brasil as pequenas e médias empresas são colocadas no mesmo nível. Isto faz com que o pequeno minerador seja forçado a trabalhar na ilegalidade. “O Estado tem que trazer um ambiente onde o grande, já desenvolvido, possa ajudar o pequeno e o médio minerador, o que eu chamo de “inclusão empresarial”. A Vale dominava Carajás e de dez anos para cá a companhia implantou a parceria com as pequenas e médias da região. 

Sobre o critério de classificação, Ronaldo Lima disse que é possível usar tanto a tonelagem quanto o faturamento. No Pará, a lei da taxa é feita em cima da tonelagem. “Cabe o cruzamento dessas duas unidades para se definir o que é pequeno, médio e grande’”. Ele acrescentou que antigamente, existia uma competição enorme entre as mineradoras. Hoje em dia, as companhias lutam pelo Brasil, muito em função da Vale e que deveria ser incentivado. 

De Tomi disse que este conceito das grandes mineradoras trabalharem em conjunto é chamado de coexistência. Na Colômbia, eles não precisam do Governo. Eles trocam informações, tecnologias. Já o representante da SEDEME-PA comentou que as empresas precisam conversar. “Uma empresa tinha um investimento e outra também, e acabavam se atropelando. É preciso uma integração, mas sou cético. O papel do Estado é importante para debater a questão”. 

A pequena e média mineração no Norte tem grande potencial e o setor precisa trabalhar em conjunto para mudar a imagem da mineração e impulsionar o desenvolvimento na região. Já Luís Maurício diz que “nossos problemas são grandes”, mas que o Norte é o celeiro dos negócios do setor para diversificar a produção mineral. “Temos oportunidades para pensar no futuro e trabalhar em parceria”. Por último, Ronaldo Lima enfatizou o licenciamento ambiental na mineração. “Não há nada na legislação ambiental que trate do pequeno minerador. A mineração é pressionada, mas o setor tem um cuidado ambiental muito grande com atividade mineral”. Lima mencionou que várias atividades ilegais estão explorando recursos renováveis e é um prejuízo que não será recuperado.